domingo, dezembro 11, 2005

Onde quer que estejas

O meu amigo chamava-se João. Muito antes de nos conhecermos já ele era amigo de outros amigos meus. Isso não mudou.

O João gostava de passar horas numa varanda a olhar a estrada e os carros a passar. Em especial, gostava de o fazer durante a noite - durante as noites serenas de verão no centro de uma qualquer cidade europeia em que a historia fosse uma peça fundamental da brisa que corria. Gostava de ficar em hotéis baratos pois achava que só assim conseguia sentir verdadeiramente a cidade. As cidades ficavam-lhe sempre na memoria pela forma como os carros se movimentavam (desordenadamente a maior parte das vezes) mas também pelos cheiros que sempre o deixavam constrangido na primeira vez que os sentia. Também era verdade que o cheiro de uma cidade nunca era igual ao de outra e isso dava-lhe uma garantia de ter uma identificação única para cada uma delas.

Para o João o importante eram as pessoas, as conversas, as cores e, obviamente, os cheiros. Muitas vezes sentia-se mal por se julgar tão responsável - afinal de contas a sociedade não dava valor algum ao facto de ele tentar manter determinados valores. Sentia-se mais sereno cada vez que consegui conhecer alguém com quem o silêncio fizesse todo o sentido.

Um dia houve em que o João teve que partir. Desta vez definitivamente - gosto de dizer definitivamente e não "para sempre": a esperança de que o João volte, e que algumas conversas se possam repetir, são muito mais fortes. A paixão que o assaltou foi muito maior que tudo o resto. Levou consigo uma das nossas amigas. Gosto de pensar que vivem momentos inesquecíveis.

Há muito tempo que não sei de notícias do João, não sei se alguém tem tido, mas penso que continua a ser amigo de alguns dos meus amigos - muitos daqueles que também já há muito tempo não sei nada. Talvez o João se sinta melhor assim. Talvez as coisas complicadas sejam mais fáceis de lidar desta forma.

Tenho a certeza que o João pensa, de quando em vez, em como os acontecimentos teriam sido diferentes caso não tivesse decidido ir embora e levar com ele uma das nossas melhores amigas.

Para o João, onde quer que ele esteja: um bem haja e tudo de bom.

1 comentário:

Biedonka disse...

Será que qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência?